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Como Paris cortou a poluição do ar pela metade em duas décadas

Políticas públicas ambiciosas limitaram carros, ampliaram ciclovias e abriram espaço para áreas verdes, trazendo ganhos visíveis e invisíveis

A Champs-Élysées, a Torre Eiffel e todo o charme que envolve Paris fazem da capital francesa um dos destinos turísticos mais procurados do mundo. O que nem sempre aparece nos cartões-postais, porém, é que a Cidade Luz também se tornou referência em sustentabilidade, liderando uma transformação urbana que inspira metrópoles em todo o planeta…

Há vinte anos, quem caminhava por Paris dividia o espaço com o barulho incessante dos carros e o ar pesado da poluição. 

Foto de Merlijn Simonis na Unsplash

Hoje, a mesma cidade revela outro cenário: mais silencioso, mais verde e com um ar notavelmente mais limpo para respirar.

Foto:  Matthieu Oger na Unsplash

De acordo com a Airparif, organização independente que monitora a qualidade do ar na região metropolitana da capital francesa, os níveis de material particulado fino* (PM2,5) caíram 55% na cidade desde 2005, enquanto as concentrações de dióxido de nitrogênio recuaram 50%. 

Os mapas de calor elaborados pela entidade mostram o contraste: se antes quase todos os bairros estavam cobertos por manchas vermelhas indicando níveis de poluição acima do limite estabelecido pela União Europeia, em 2023, a zona crítica havia encolhido para poucas linhas acompanhando as avenidas mais movimentadas.

Infográfico: The Washington Post, com dados da Airparif
Infográfico: The Washington Post, com dados da Airparif

*Para entender melhor:

  • PM2,5: O material particulado é uma mistura de partículas microscópicas suspensas no ar, provenientes principalmente da queima de combustíveis fósseis, pneus e freios de veículos. A sigla PM2,5 se refere a partículas com diâmetro inferior a 2,5 micrômetros – cerca de 30 vezes menores que um fio de cabelo humano. Justamente por serem tão pequenas, essas partículas são consideradas um dos poluentes mais perigosos, uma vez que conseguem penetrar profundamente nos pulmões, alcançar a corrente sanguínea e afetar órgãos vitais como coração e cérebro.
  • NO₂: Gás formado na queima de combustíveis (trânsito e caldeiras), irrita as vias respiratórias e agrava asma e bronquite, além de contribuir para a formação de ozônio ao nível do solo.
  • Por que importam: São indicadores-chave de poluição urbana e risco à saúde — quedas nesses poluentes tendem a representar ganhos diretos para a qualidade de vida.

Como isso aconteceu

A mudança é resultado de políticas públicas ambiciosas. O processo começou nos anos 2000, mas se intensificou significativamente a partir de 2014, quando Anne Hidalgo assumiu a prefeitura e passou a defender uma “Paris que respira, uma Paris mais agradável de se viver”.

Desde então, a cidade eliminou cerca de 50 mil vagas de estacionamento, fechou trechos inteiros de ruas para carros, transformou margens do rio Sena em áreas de lazer e reduziu drasticamente o tráfego na Rue de Rivoli, um dos principais bulevares comerciais da cidade. 

Foto de Lens by Benji na Unsplash

Além disso, em 2024, a prefeitura aumentou as tarifas de estacionamento para SUVs, desestimulando a circulação de veículos maiores. Mais recentemente, um referendo aprovou a criação de 500 novas ruas exclusivas para pedestres.

Impactos além do meio ambiente e a visão do público

A redução da poluição não é apenas uma conquista ambiental, mas também sanitária. Partículas finas e gases tóxicos oriundos da queima de combustíveis fósseis estão associados a doenças graves, como infartos, câncer de pulmão, bronquite e asma. O exemplo parisiense mostra como escolhas urbanas podem salvar vidas, ao mesmo tempo em que tornam a cidade mais verde e habitável.

Isso não significa, porém, que todo mundo concorde com essas iniciativas.

As medidas implementadas por Hidalgo enfrentam resistência de políticos de oposição, associações de motoristas e trabalhadores que vivem nos subúrbios, muitos dos quais dependem do carro no dia a dia. Apesar disso, a transformação urbana segue firme, sustentada em uma visão que prioriza o bem-estar coletivo e a saúde pública.

Redes globais contra a poluição do ar

A capital francesa não enfrenta o desafio da poluição sozinha. Paris participa de duas redes globais que conectam metrópoles comprometidas com a qualidade do ar.

A primeira é a BreatheLife. Apoiada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), a iniciativa conecta cidades comprometidas com a melhoria da qualidade do ar, oferecendo orientação técnica e compartilhamento de experiências.

Mais recentemente, Paris aderiu também ao Breathe Cities, uma coalizão liderada pela Bloomberg Philanthropies, C40 e Clean Air Fund que oferece apoio técnico e financeiro para acelerar políticas de ar limpo.

Na prática, essas redes oferecem algo concreto: dados, estratégias testadas e até financiamento disponível. 

O caminho já foi aberto – e municípios de qualquer tamanho podem percorrê-lo, adaptando as soluções à sua própria realidade. A cada ciclovia construída, a cada zona de baixa emissão implementada, a cada sensor instalado, cidades engajadas na transformação urbana não apenas reduzem a poluição e salvam vidas, como também combatem a crise climática.

Informações: The Washington Post, RFI / Imagem de destaque: Masood Aslami

Leia também:
Uniã​o Europeia aprova normas mais rigorosas contra a poluição atmosférica


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Publicado por
Tom Schiebel

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